15/08/2012

Diário de realidade: A memória dos velhos I

O nome dele é Falcão não sei quantos anos tem. Mas, é um senhor como qualquer um. Traços de velhice no corpo. Cabelos brancos, Magro, Voz serena. Um típico vôvô. Depois de alguns dias que ele chegou aqui e eu o vi. Lembrei dos meus avós que já se foram. Lembrei da sabedoria deles. Das risadas. Das histórias. De tantas e tantas lembranças. Pensei nas possíveis memórias que aquele velho poderia ter. Pensei nos porquês de estar numa quarto e banheiro sozinho sem quase nada. Lá continha ele, uma rede, uma "preguiçosa", uma cômoda com suas roupas e pertences, um ventilador, uma rede e um rádio. E ele. Lá. Só. Sozinho e cego. Repito para mim mesmo sozinho e cego. O que isso significa para ele? O silêncio da escuridão? E ai me vem algumas outras interrogações. O porquê do abandono? O porquê do descarte dos velhos na nossa sociedade? O porquê? Será que ele fez algo tão grave de não ter o direito de conviver com a família? Será que ele têm família? São tantas perguntas sem respostas. O meu coração ele aperta e as lágrimas descem. Tive coragem esses dias de me apresentar. Eu cheguei disse que era a sua vizinha. Falei meu nome e puxei uma dose de prosa com ele. Começei a responder as minhas perguntas e descobri que têm filhos e ex-mulher e tudo mais. Que saiu de um abrigo de velhos porque não aguentou a má estrutura e prefere ficar alí só. Porque é mais confortável para o seu eu? Foi motorista por quarenta anos e deduzi que ele já teve visão. Mais uma pergunta: - O que é ter visão e depois tudo virar escuro? Eu vou conversando com ele escutando e observando a forma de falar. Mexer. E ele. Esse senhor. Seu Falcão. Num sabe o quanto está mexendo comigo. Me dando doses cavalais de realidade e de reflexão. E eu fiquei me perguntando mais uma vez: - O que posso fazer por ele? Um jovem numa conversa me falou: - Você pode conversar com ele quando tiver em casa. Ele tem um rádio mais não dialoga com ele. Você pode lhe ajudar nisso. Não custa nada, né? Não está me custando nada mesmo. Acordei num dia de feriado. Fiz meu café e cuzcuz e fui lá embaixo e ofereci a ele. Ele aceitou no ato. Disse: - Minha filha minha mãe fazia cuzcuz com café pra mim. E então as memórias dele vai vindo aos poucos. A gente conversou um pouco mais. Ele comeu tudo e me agradeceu muito porque eu fiz o cuzcuz com ovo e café do jeito que a mãe dele fazia. Me agradeceu por fazer ele lembrar. Me virei e segui para o resto do meu dia e lá no fundo agradeci a ele por esse momento de sabedoria dos nossos queridos velhos tão maltratados pela o ideal jovem da nossa sociedade...

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